DIGITAL: MP altera regras sobre Moderação de Conteúdo pelas Redes Sociais

Nesta segunda, 06/09, o presidente Jair Bolsonaro assinou uma medida provisória que altera o Marco Civil da Internet, Lei 12.965, de 23/4/2014, que estabelece princípios sobre a privacidade e proteção de dados pessoais no país.

Em entrevista à CBN, nosso sócio e professor de Direito Digital, Marcelo Chiavassa, aborda que a MP tem o objetivo claro de tentar evitar qualquer tipo de moderação em relação às fake news. Além disso, a dificuldade de denunciar conteúdos na rede social, por exemplo, obrigaria os usuários a procurar mais a Justiça.

Ouça agora mesmo a consideração do nosso especialista clicando aqui! 

 

Marcelo Chiavassa também preparou um conteúdo exclusivo sobre o tema para nosso site.
Confira agora mesmo:


– Governo altera o Marco Civil da Internet e estabelece regras sobre moderação de conteúdo pelas plataformas de redes sociais

O Presidente Jair Bolsonaro editou (06/09/2021) a Medida Provisória nº 1.068/2021, que altera o Marco Civil da Internet e acrescenta regras sobre moderação de conteúdo pelas plataformas de redes sociais. 

A iniciativa, que vinha sendo estudada desde o começo do ano, precisa ser criticada por ser imposta unilateralmente (sem debates com a sociedade) e em patente violação aos preceitos constitucionais, especialmente pela falta dos requisitos exigidos para edição de uma Medida Provisória: urgência e relevância. 

No que se refere ao conteúdo, a MP possui méritos e (muitas) dúvidas. Sobre os méritos, destacam-se os direitos dos usuários destas plataformas (arts. 8º-A), especialmente as regras sobre critérios de moderação claros e transparentes a serem definidos nos termos de uso das plataformas e o direito ao contraditório, assegurado, inclusive, pela Constituição Federal brasileira como direito fundamental. Aqui, aliás, cabe a seguinte indagação: o que as plataformas consideram “fake news” para fins de moderação de conteúdo? A pergunta, aparentemente sem sentido, traz grandes problemas, na medida em que não é um conceito jurídico e tampouco temos leis que estabeleçam critérios que permitam a sua qualificação como tal. Isso abre portas para que cada plataforma utilize seus próprios critérios (muitos deles não transparentes), algumas vezes sem qualquer fundamento técnico. O Governo não está de todo errado ao se insurgir contra a moderação destas plataformas por conta de “fake news”, mas o caminho escolhido está longe de ser o ideal.

As dúvidas, por outro lado, poderiam ter sido supridas com um pouco mais de maturidade das ideias e debate público. Logo de início, há que se tentar responder se as hipóteses de justa causa (que permitem o ato de moderação de conteúdo pelas plataformas) são taxativos ou exemplificativos. Uma primeira leitura permite defender que se trata de hipóteses meramente exemplificativas, embora pareça evidente que a pretensão por trás da norma é evitar a moderação de conteúdo conceituado como “fake news”. Essa interpretação caberá aos Tribunais e caso eles decidam que se trata de rol taxativo, provavelmente precisaremos lidar com uma crescente judicialização deste tipo de demanda (já que as redes sociais não poderão moderar conteúdo fora das hipóteses previstas na MP). 

A judicialização massiva faz com que o usuário tenha mais ônus, na medida em que precisará contratar advogado, pagar custas judiciais, arcar com a morosidade do judiciário (principalmente quando a ideia for remover determinados conteúdos que considere prejudiciais à sua pessoa), facilitando com que o dano se propague por mais tempo e com mais força. Isso poderá fazer com que as plataformas se tornem ambientes cada vez mais insalubres, na medida em que as hipóteses de moderação seriam apenas pontuais e nem todas as vítimas irão aceitar o ônus de buscar o Poder Judiciário para atos quotidianos e sem grande potencial lesivo.

Outra relevante dúvida é o alcance do termo “inadimplemento do usuário”, previsto no artigo 8º-B, §1º. Como se sabe, as redes sociais são gratuitas, o que pode fazer parecer que a primeira hipótese de justa causa é inútil. Entretanto, o conceito jurídico de inadimplemento é mais abrangente, e pode permitir que as plataformas moderem conteúdo pelo não cumprimento do usuário aos seus termos de uso. Com isso, existiria a possibilidade de que a atuação das plataformas pode ser mais comum do que se supõe. 

Muitas outras questões poderiam ser debatidas, mas, em linhas gerais, a MP possui pontos positivos e negativos. Entretanto, pelos aspectos formais acima apresentados, não deverá ter vida muito longa no ordenamento jurídico brasileiro.

Marcelo Chiavassa – Professor de Direito Digital da Universidade Presbiteriana Mackenzie e sócio de Direito Digital do Morais Andrade. Converse com ele!