DIGITAL E CONSUMIDOR: PL do GovTech prevê a Cobrança de uso Dados Públicos

No dia 25 de fevereiro foi aprovado na Câmara e no Senado, seguindo para voto presidencial, o PL 317/2021, conhecido como PL das GovTechs, buscando a implementação do Governo Digital. O PL, que cria uma plataforma digital única para serviços público, instaurando um ambiente propício para o surgimento de startups que tenham como objetivo o atendimento de políticas públicas, é um documento que “dispõe sobre princípios, regras e instrumentos para o Governo Digital e para o aumento da eficiência pública”. O intuito da norma é alcançar uma desburocratização na prestação dos serviços públicos, que poderão ser acessados pelos cidadãos também em aplicativos em seus celulares.

 

Ponto que merece destaque é aquele previsto no art. 29 do Projeto, o qual inicia a seção I referente à abertura dos dados, dispondo que “os dados disponibilizados pelos prestadores de serviços públicos, bem como qualquer informação de transparência ativa, são de livre utilização pela sociedade, observados os princípios dispostos no art. 6º da Lei nº 13.709, de 14 de agosto de 2018 (Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais)”. Essa disposição corrobora com as iniciativas até então adotadas pelo país quanto à Política de Dados Abertos. Mas uma controvérsia pode ser destacada do §3º do referido artigo, uma vez que faculta ao setor público controlador de base de dados abertas a cobrança pelo uso dos dados públicos (mineração dos dados), a depender do volume de dados que empresas necessitam para um determinado tratamento.

Essa previsão, ao contrário do que é previsto no caput do artigo, pode conflitar com a política de dados abertos adotada pelo Brasil, uma vez que não mais existiria o livre acesso aos dados públicos para serem tratados pelas empresas, seja para finalidades financeiras, seja para criação de políticas públicas. Caso aprovado o PL nos termos atuais, empresas, independente do tamanho e volume de dados que tratem, terão que se preparar (financeiramente) às novas regras. O PL 317/2021, após aprovação na Câmara e Senado, segue para sanção presidencial, com prazo previsto para 29 de março. Caso não ocorram vetos no que diz respeito à mineração dos dados públicos, novos desafios surgirão na busca pela adequação das empresas às novas condições, mas também legislativa.

 

O Presidente Jair Bolsonaro tem poucos dias para decidir pela sanção/veto do projeto, no todo ou em parte. Muitas empresas e órgãos da sociedade civil já envidam esforços postulando pelo veto deste dispositivo. Nesse sentido, inclusive, o Instituto de Tecnologia e Sociedade do Rio de Janeiro – ITSRio juntamente com a AB2L e outras organizações, publicaram uma Carta Aberta pedindo pelo veto parcial do presidente ao PL, no que diz respeito ao §3º do art. 29, fundamentando a necessidade do veto com os seguintes argumentos:

 

(i) É contrário às recomendações da OCDE e a lógica prevalente internacional de uma economia de dados em que dados públicos abertos servem como infraestrutura permitindo o desenvolvimento de inúmeros novos negócios;
(ii) Atenta contra os princípios da administração pública (art. 37 Constituição Federal) pois impõe restrições à publicidade, viola a impessoalidade ao criar um desequilíbrio no acesso a serviços públicos em benefício de quem tem mais recursos e atenta contra a eficiência ao criar uma nova barreira de acesso. Inclusive, é contrário ao objetivo de inovação previsto na reforma administrativa proposta pelo Ministério da Economia. Ademais, também viola os princípios constitucionais da livre iniciativa e da livre concorrência; e,
(iii) Desincentiva o uso de dados abertos, caminho reverso de diversos países como Canadá, Estados Unidos, Reino Unido, Austrália e Irlanda que incentivam e promovem o acesso a dados públicos.

 

A continuidade da adoção de medidas que promovam a constante inovação no país, permitindo a criação de um ambiente digital seguro e uma economia de dados frutífera, depende da coerência regulatória adotada pelo Estado e limitar a utilização de dados públicos pela cobrança pela sua utilização pode não ser o melhor caminho para esta medida.

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